Piaui em Pauta

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O evento aconteceu no auditório da Unidade Escolar Santo Antônio e contou com a

Piauiense lança livro "Sons do Sertão: Luiz Gonzaga, Música e identidade"

Publicada em 24 de Maio de 2013 �s 17h14


A Diretora Geral do Núcleo de Educação a Distância da Universidade Estadual do Piauí, Márcia Percília, esteve presente na última sexta-feira (17) no lançamento do Livro "Sons do Sertão: Luiz Gonzaga, Música e identidade" do escritor piauiense Jonas Rodrigues de Moraes.  O evento foi organizado pelo pólo da Universidade Aberta do Brasil, em Valença-PI, e  pela Secretaria da Educação e Cultura do Piauí-Seduc.

A solenidade de abertura foi marcada por uma peça teatral organizada pelos alunos e professores tutores do pólo de  Valença e logo em seguida uma palestra com o autor do livro sobre o tema: "Luiz Gonzaga - Araripe e sua Cultura Clássica". Para finalizar,  uma apresentação de um grupo de músicos locais.

Sobre a importância do personagem Luiz Gonzaga para o Nordeste, a professora Márcia Percília diz que "além da integração entre a comunidade e a universidade, o livro mostra a grande importância histórica, cultural e artística que o personagem  tem para a nossa região".

Para a Coordenadora do Pólo da UAB de Valença, Maria de Fátima Barros Santos, o livro faz um resgate de nossas raízes nordestinas. "O livro reafirma e resgata nossas raízes e, além disso, a questão histórica e origem da cultura nordestina está presente na análise dos discursos presentes no texto do livro com o retrato da historia do homem nordestino", ressalta a coordenadora.

O evento aconteceu no auditório da Unidade Escolar Santo Antônio e contou com a presença de aproximadamente 200 pessoas.

Entrevista A análise do discurso nordestino no livro "Sons do Sertão: Luiz Gonzaga, Música e identidade"

O eterno rei do baião, Luíz Gonzaga, comemorou, em 2012, cem anos de história. Dessa forma, o escritor piauiense Jonas Rodrigues traz, através da análise do discurso na produção musical de Gonzaga, os traços característicos do sertão nordestino baseado nos gêneros musicais do artista, que fazem parte da tradição discursiva de um imaginário de Nordeste.

O escritor Jonas Rodrigues Moraes é Mestre e doutorando em História Social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), ex-bolsista Ford (IFP), professor colaborador na Faculdade Piauiense (FAP) e atuou também como professor colaborador no Curso de História da Universidade Estadual do Piauí – UESPI, leciona história e artes no ensino fundamental e médio da rede pública estadual do Piauí e municipal de Caxias-MA.

Também é membro do grupo de pesquisa Núcleo de Estudos Culturais: Histórias, Memórias e Perspectivas do Presente (PUC/SP) e integrante do Cineclube Olho Mágico da Associação dos Docentes da Universidade Federal do Piauí (ADUFPI). Suas pesquisas estão focadas na relação da história com a música, literatura, artes, cinema, linguagem e antropologia. Tem participado de encontros e simpósios nacionais e regionais proferindo comunicações e palestras sobre temáticas relacionadas ao universo estético gonzagueano e sobre a música popular brasileira. Experiência internacional com intercâmbio cultural na University of Arkansas (USA). Publicações de artigos e textos nas revistas e jornais: Mnemosine (Psicologia Social - UERJ), Desenredos (Piauí), Projeto História da PUC/SP, Caderno de Teresina (FMC), Jornal O Dia (Teresina-PI) e Jornal Meio Norte (Piauí – Maranhão).

ASCOM: Como surgiu a ideia de escrever um livro sobre a produção musical de Luíz Gonzaga?

JONAS MORAES: o livro “SONS DO SERTÃO: Luiz Gonzaga, música e identidade, Annablume editora, 2012 é fruto da dissertação de mestrado defendida em outubro de 2009 no Programa de Pós-Graduação em História Social da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP.

A escolha desse tema emergiu pelo meu envolvimento e de minha família com a música. Cresci no universo povoado pelas canções do sanfoneiro Luiz Gonzaga e a relação de meus familiares com a música vem das décadas de 1940 e 1950, período em que se deu o auge do baião. A produção musical dos sanfoneiros e das bandas de bailes no final de 1970, e nas décadas de 1980 e 1990 despertou meu interesse para analisar a música com um corpus documental de extrema riqueza e pouco explorada nas análises da historiografia. Observava o quanto meu pai, Cícero de Moraes, se interessava em organizar os bailes de forró na comunidade Recanto, município de Paes Landim-PI, isto ocorrera no final da década de 1970. Muitas dessas festas eram animadas por Zequinha de Gaudêncio ou Manelito, dois sanfoneiros negros cujos repertórios eram repletos de músicas de Luiz Gonzaga. Além de animar as festas na zona rural paeslandinense, esses músicos, com suas sanfonas, percorriam as cidades de Simplício Mendes-PI, Campinas-PI, Conceição do Canindé- PI, entre outros municípios que fazem parte da região denominada Vale do Fidalgo.

ASCOM: Quais as principais dificuldades para escrever o livro?

JONAS MORAES: Como toda pesquisa acadêmica requer muito rigor científico. Tive que frequentar museus, arquivos, bibliotecas em várias cidades do país. Fui aos museus: Imagem e do Som (MIS-RJ), Gonzagão em Exu-PE, da Língua Portuguesa em São Paulo, estive no acervo do Centro Cultural São Paulo (CCSP) coletando fontes de jornais e revistas relacionadas à produção estética e musical de Luiz Gonzaga. Frequentei o Centro de Tradições Nordestina em São Paulo e no Rio de Janeiro, e a feira dos nordestinos no bairro de São Cristovão Rio de Janeiro. Todas essas viagens foram importantes para escritura do livro. Como bolsista da Fundação Ford facilitou o deslocamento por essas cidades. Depois do material reunido veio o prazer e um pouco de sofrimento, porque tive que fazer escolhas das fontes necessárias para escrita do livro, e manter organização do texto com coerência e conexões com as fontes. A maior dificuldade foi para publicar a obra em virtude de que não tive apoio das agências financiadoras.

ASCOM: A tradição cultural do nordeste está presente na música, símbolos e imagens que são traços características da região. Como o senhor enfatizou isso no livro?

JONAS MORAES: O livro mostra que a tradição é uma invenção constante. O cancioneiro estético gonzagueano veio no movimento da tradição, Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira como re-inventores do baião utilizaram da paisagem sonora nordestina para construir este repertório. A produção musical desenvolvida no início de sua carreira artística veicula-se a uma prática da sanfona tocada nas festas e bailes na região do Araripe. Gonzaga se apropriou dos gêneros: baião, xaxado, xote, maracutu, torrado, entre outros ritmos para construir discursos identitários de Nordeste e nordestinos. As temáticas sobre a saudade, a dor, a seca, o baião, o sertão, o vaqueiro, a vaquejada a religiosidade, o cangaceiro, entre outras colaboraram para criação desta nordestinidade. A tradução discursiva de Nordeste e de nordestino foi engendrada também por imagens e símbolos a partir de uma indumentária retirada das tradições regionais (cangaceiros e vaqueiros) e ressignificada pelo artista dentro de um contexto social urbano.

ASCOM: Qual a importância dos discursos nordestinos presentes na produção musical de Luís Gonzaga?

JONAS MORAES: Indubitavelmente que os discursos sobre o Nordeste e os nordestinos estiveram presentes na política, na literatura, nas artes e na música. As temáticas abordadas sobre o nordestino foram bastante exploradas pelos escritores do romance de 1930, como José Américo de Almeida, José Lins do Rêgo, Rachel Queiroz, Graciliano Ramos etc. O repertório gonzagueano contribuiu para uma discursividade de Nordeste focado na seca, saudade, dor, miséria e de um ser nordestino sofredor que foi desenvolvido ao longo do tempo histórico. A região Nordeste não era conhecida com este nome. As recorrentes secas de 1845, 1877/1879 e 1915 inauguram esses estereótipos sobre o Nordeste e o nordestino. Luiz Gonzaga, por cantar e “descrever” o Nordeste, não ficou de fora dessa dizibilidade. Embora existisse no repertório gonzagueano várias canções que expressavam outras paisagens sonoras do Brasil, a tônica da obra do sanfoneiro foi, com efeito, a construção de uma identidade focada no sofrimento, na miséria e na seca nordestina dito anteriormente. Ele não se dissociou desses clichês sobre o Nordeste, em virtude de que essas noções estavam não somente na música, mas em outros sistemas semióticos.

ASCOM: A  partir de uma análise identitária, como o senhor avalia a importância da música de Gonzaga para a região nordeste?

JONAS MORAES: Como diz Stuart Hall “a identidade é uma celebração móvel”. Em se tratando da trajetória artística de Luiz Gonzaga e da construção e reinvenção do baião pelo compositor/sanfoneiro percebe-se que ele instituiu a ideia de Nordeste e nordestino por meio dos elementos: seca, sertão, baião, saudade, vaqueiro, aboio, dos ritmos tocados pelo resfôlego de sua sanfona e, sobretudo, pela criação de sua indumentária. Nas décadas de 1940 e 1950 vivíamos no balanço do samba e do samba-canção – música de dor de cotovelo e de meio de ano – precisava de uma música dançante, o baião se tornou esse achado.  O baião e outras sonoridades nordestinas foram às chaves para ingressar na incipiente indústria fonográfica brasileira. Luiz Gonzaga descobriu o mapa da mina quando tocou o chamego “Vira e mexe” (Luiz Gonzaga, 1941) num bar do Rio de Janeiro onde foi desafiado por estudantes cearense que moravam nesta cidade. Este encontro foi fundamental para que o sanfoneiro do Araripe procurasse ingressar de forma organizada no meio artístico brasileiro. O baião foi estilizado por ele e Humberto Teixeira em 1946 e permaneceu na mídia por volta de 1956, posteriormente veio à bossa nova. Luiz Gonzaga foi imprescindível para música popular brasileira, Caetano Veloso, Gilberto Gil afirmam categoricamente que base da Tropicália é o baião, a sua música está presente também no movimento Manguebeat e em outros movimentos musicais. Torquato Neto na obra “Balanço da Bossa” de Augusto de Campos declarou: “de qualquer maneira, lá, da Bahia pra cima, todos nós crescemos sob o influxo de Luiz Gonzaga. Lá no Piauí os altos-falantes não tocavam outra coisa o tempo todo”. Com efeito, o legado musical e artístico criado por Gonzaga foi importante não só para o cancioneiro brasileiro mas também para que os artístas nordestinos fossem respeitados no centro-sul do país.

ASCOM: Como o senhor explica a  importância da construção da musicalidade nordestina na produção musical de Gonzaga?

JONAS MORAES: Gonzaga tornou-se importante porque trouxe em seu matolão um conjunto de ritmos, alguns deles oriundos de sua paisagem sonora do Araripe como: baião – (re)inventado e estilizado por ele e Humberto Teixeira –, toada, xaxado, “xote”, aboio, arrasta pé, rojão, chamego, côco, embolada forró, frevo, maracatu, ladainhas, benditos, incelências, entre outras manifestações da cultura acústica nordestina. Estes gêneros expressos na estética gonzagueana criaram no imaginário social do país um Nordeste marcado pela dor, mas também pela alegria, de modo que sua musicalidade produziu reverberação em seus ouvintes e na cultura brasileira.

Embora o Nordeste se caracterize por uma pluralidade de ritmos e sons, o compositor Luiz Gonzaga utilizou essa pluralidade para construir uma ideia única de Nordeste. Entretanto, esses ritmos e sons da linguagem musical provocaram no ouvinte toda uma representação simbólica de Nordeste, o que por si só nega a visão homogênea da região, anunciando vários Nordestes. Dessa forma, Luiz Gonzaga, a partir dos ritmos e letras das canções, contribuiu para fortalecer o imaginário de Nordeste. Delimitou suas fronteiras territoriais, instituindo a sua música, a sua linguagem, os seus ritmos. Portanto, a música de Gonzaga figurou como um discurso identitário de Nordeste e de nordestino.

ASCOM: Qual a importância do livro "Sons do Sertão" para a comunidade acadêmica?

JONAS MORAES: O livro "Sons do Sertão" foi escrito na relação da História com a Música e suas formas de interpretação, a obra procura ressaltar que a musicalidade de Gonzaga foi construída no entre-lugar sertão nordestino/ terras civilizadas. Foi a partir de 1980 que historiografia descobriu a música como uma importante fonte sonora reveladora das “zonas obscuras” e do cotidiano social das pessoas. O documento “música popular” deve ser analisado pelas produções acadêmicas não de forma fragmentada, mas fazendo articulação entre letra, música, estética e ideologia. O pesquisador que trabalha com relação História e Música não deve separar a realidade social vivida por seus compositores da conjuntura social do momento. Partindo da produção de Gonzaga no conjunto da música brasileira de seu tempo, o livro propõe criar rupturas nessa tradição de fragmentar letra, música, estética e ideologia. Desse modo, a canção brasileira se constituiu num mosaico complexo e explicativo das identidades nacionais. A música popular produz significados, ganha concretude na memória coletiva do ouvinte/receptor, cria sociabilidades e interage como um elemento de aprendizagem cultural no cotidiano. Nesse contexto, o documento musical torna-se imprescindível para a reconstituição histórica dos sujeitos sociais no seu cotidiano. Por meio destes postulados “Sons do Sertão” torna-se importante para comunidade acadêmica porque mostra a riqueza da cultura acústica e da paisagem sonora nordestina abordada no cancioneiro gonzagueano.



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Fonte: Governo do Estado �|� Publicado por:
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