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Júri do Carandiru começa hoje

Júri do Carandiru começa hoje com Fleury e sobreviventes de massacre como testemunhas.

Publicada em 08 de Abril de 2013 �s 08h39


Sobreviventes do massacre do Carandiru, 26 policiais militares da ativa e aposentados e autoridades públicas do Estado à época, como o ex-governador Luiz Antonio Fleury Filho, começam a reconstruir a partir desta segunda-feira (8) perante o júri, mais de 20 anos depois, as versões de que os crimes foram praticados sem chance de defesa às vítimas, como sustenta a acusação, ou em cumprimento a ordens de superiores, como alega a defesa.

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O episódio, classificado pela OEA (Organização dos Estados Americanos) em 2000 como massacre, aconteceu na extinta casa de detenção do Estado em 2 de outubro de 1992. Ao todo, 111 presos morreram e 87 ficaram feridos. O saldo final não teve PMs mortos, mas 22 homens da corporação se feriram.

Como são réus soltos, os PMs não são obrigados a comparecer ao próprio julgamento, que tem previsão de durar duas semanas no Fórum Criminal da Barra Funda (zona oeste de SP). "Mas me causaria muita perplexidade a pessoa que se diz inocente não querer se defender", afirmou um dos promotores do caso, Márcio Friggi.

O julgamento foi dividido em quatro partes pelo juiz do Fórum de Santana (zona norte de SP), José Augusto Nardy Marzagão designado para o caso, a fim de que os jurados possam analisar o fato conforme a ordem de entrada dos PMs no pavilhão 9 nos pavimentos em que as mortes ocorreram. Assim, os 26 réus de agora respondem por homicídio qualificado por 15 assassinatos no segundo pavimento do pavilhão, equivalente ao térreo.

"Vamos respeitar a ordem colocada pela acusação, delineando as condutas dos réus, até para não confundir os jurados", disse o juiz.


Após a sentença, Marzagão –que em setembro de 2012 designou a data do júri –deve definir a data do próximo júri: desta vez, o de 28 PMs, da Rota, acusados pela morte de 73 presos do terceiro pavimento. O magistrado disse que espera julgar o caso todo até o final deste ano.

De todas a acusações, 86, de lesão corporal leve, já prescreveram. As de homicídio prescrevem em 2020.
Perícia prejudicada

O júri estava marcado para janeiro deste ano, mas foi adiado após pedido da defesa e da acusação para que a pericia de confronto balístico fosse refeita. Mês passado, o Instituto de Criminalística enviou ofício ao Judiciário informando que nova perícia seria inviável por razões técnicas. De 28 projéteis para laudo, por exemplo, apenas três, segundo o IC, estão em condições de análise em função das mais de duas décadas decorridas. Dos 350 revólveres, 250 estão sem condições, e, no restante, ela não seria conclusiva.

Para o Ministério Público, no entanto, a impossibilidade técnica de se individualizar qual policial matou qual preso não deve dificultar os trabalhos da acusação.

"A imputação feita aos acusados nunca foi a de conduta individualizada, nem precisa, quando se fala em uma situação de concurso de pessoas para a prática de crime. O confronto balístico nunca foi imprescindível, nessa linha", disse um dos promotores do caso, Márcio Friggi.


"O importante é que não se trata de um julgamento da PM do Estado de São Paulo; não é a instituição, que sempre foi nossa parceira, sentada no banco dos réus: falamos de policiais e ex-policiais que violaram a lei, e, por isso, estão sendo julgados", completou o promotor titular, Fernando Pereira da Silva.

"Muita gente na sociedade ainda entende que bandido bom é bandido morto. De nada adianta vai adiantar todo um conjunto probatório se os jurados julgarem com base nessa linha", disse Friggi, nessa sexta (5), na entrevista coletiva em que o MP falou sobre os preparativos para o julgamento.
Defesa

Ao contrário dos promotores, a advogada de todos os réus, Ieda Ribeiro de Souza, acredita que a falta de provas que individualizem a conduta dos réus prejudica a acusação.

"Esperamos que os jurados analisem provas. Porque é muito fácil atribuir esse caso à PM, mas não tem nada que diga que o policial X matou a vítima Y. Precisamos de isenção de ânimo dos jurados", declarou.

A advogada sugeriu que nem todos os 26 deverão ser ouvidos pela defesa, possibilidade que a lei coloca, "a fim de abreviar o sofrimento do jurado".
Testemunhas

Entre as 13 testemunhas arroladas pela acusação, estão ex-internos do Carandiru e o perito responsável pelo laudo do local do massacre, Oswaldo Negrini, hoje aposentado.

Pela defesa, foram arroladas dez testemunhas –entre elas o ex-governador Fleury e o secretário de segurança pública do Estado à época, Pedro Franco, além de juízes de varas criminais e desembargadores.

As testemunhas não são obrigadas a comparecer. Semana passada, por exemplo, a advogada dos PMs disse que Fleury não havia confirmado presença.

"Vai ser a oportunidade de ele dar algumas explicações, é interessante que vá. Por exemplo, pode dizer como foi dada a ordem para a invasão das tropas, onde ele estava naquele momento, por que a informação dos mortos só divulgada dia 3, dia de eleições municipais, já perto do encerramento da votação", declarou a advogada.

O UOL falou com o ex-governador, por telefone, mas ele não quis comentar o caso. "Tudo o que eu tinha de falar sobre o Carandiru falei nos últimos 20 anos. Não tenho mais nada a acrescentar", encerrou.
"Verdadeiro responsável nunca vai ser identificado", diz Drauzio Varella

Para o médico e escritor Drauzio Varella, integrante da equipe médica do presídio à época, o julgamento não ajudará a fazer Justiça. Além disso, para o médico, o massacre foi um marco na história do sistema penitenciário do Estado, ao promover mudanças de gestão, mas não ajudou a recuperar os presos para a sociedade.

"Os principais implicados nessa história toda estão fora de qualquer tipo de punição. Estão livres. Pergunto: quem é o culpado? Quem foi que disse: "Invada"? Afirmar que o coronel [Ubiratan] tomou essa decisão por conta própria é abusar da inteligência da gente", afirmou o médico, que, sem citar nomes, concluiu: O coronel recebeu ordem de alguém, esse é o verdadeiro responsável e, infelizmente, nunca vai ser identificado. Nem tem mais como se fazer justiça –será que se esses policiais vão levar a culpa por toda essa tragédia engendrada lá atrás por alguém que se escondeu no anonimato?", indagou.

Comandante da operação, o coronel da reserva Ubiratan foi assassinado em 2006. Chegou a ser condenado pelo Tribunal do Júri a 623 anos pelas 111 mortes, mas o Tribunal de Justiça o livrou da condenação –da qual sempre recorreu em liberdade –em 2006, meses antes de ele ser encontrado morto em seu apartamento, nos Jardins, área nobre de São Paulo.

O coronel é um dos cinco policiais que já morreram no curso dos últimos 20 anos e seis meses. Ao todo, eram 84 os acusados.




Tags: Carandiru - Massacre do Carandir

Fonte: uol �|� Publicado por: Da Redação
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